segunda-feira, 19 de abril de 2010

O PRIMADO DE PEDRO NO COLÉGIO APOSTÓLICO - I-I-2

Fpg.
"... estareis assentados... sobre doze tronos...". Ora, infere o nosso exegeta, "não há na promessa um trono mais elevado para Pedro"


Continuação da Pg. 49


Livro I - A Igreja Católica
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Capítulo I - S. PEDRO, PRIMEIRO PAPA
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§ 2 - O primado de S. Pedro no Colégio apostólico.
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SUMÁRIO - Objeções do Sr. Carlos Pereira: os 12 tronos; a missão de Samaria; S. Paulo "campeão antipapal; S. Pedro e os papas. - Provas positivas da tese católica: a superioridade de Pedro nos Evangelhos; exercício do primado na Igreja primitiva.



Passemos ao exame do segundo elo que "deve prender a metafórica barca de Pedro ao cais de uma instituição divina", p. 215. Depois de haver negado que Cristo investira Simão Pedro no primado jurisdicional da sua Igreja, contende o Sr. CARLOS PEREIRA que Pedro não foi superior hierárquico dos apóstolos. Será mister refutar separadamente esta nova asserção? Não, responde-nos o próprio adversário: "parece ocioso discutirmos este ponto, pois já se acha ele prejudicado pela discussão do primeiro. De fato, provado (!) que Pedro não é a pedra fundamental da Igreja fica destruído o ponto de apoio do seu primado de jurisdição", p. 234. Mutatis mutandi, vale para a resposta, o que se afirma da objeção. Demonstrada a superioridade universal conferida por Cristo a Pedro é ocioso mostrar que a sua supremacia se estende também aos apóstolos. Mas, apesar disso, não refugiremos de acompanhar o apologista protestante no segundo estádio de sua argumentação. A verdade é como um brilhante de muitas facetas; considerá-las todas é pôr em evidência a pureza de sua água.

Dos argumentos aduzidos pelo Sr. CARLOS PEREIRA alguns já foram expressamente analisados no parágrafo anterior. 61 Sobre eles não voltaremos a insistir. Percorramos rapidamente as outras
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61. Tais o argumento tirado de S. Mateus c. XVIII, 18 em que Jesus Cristo confere a todo o colégio apostólico o poder de ligar e desligar (ver p. 27) e o baseado na contrvérsia sobre a primazia ddbatida entre os apóstolos (ver p. 9). Ambos já foram criticados e rebatidos.___

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provas com o irreconciliável inimigo do primado de Pedro cuida poder estabelecer a igualdade jurisdicionados "Doze" no colégio apostólico.


O doze tronos. - Falando aos apóstolos diz Cristo: "Em verdade vos digo que vós, que me tendes seguido, na regeneração, quando o Filho de Homem se tiver assentado na sede de sua majestade, estareis assentados também vós sobre doze tronos, julgando as doze tribos de Israel" 62 Ora, infere o nosso exegeta, "não há na promessa um trono mais elevado para Pedro", p. 236. - Por uma razão muito simples, caro senhor; no céu não há nem pode haver exercício de jurisdição papal. No passo aduzido, Cristo promete um prêmio particular aos doze privilegiados de sua eleição. Ora, o prêmio da glória é proporcionado à graça. No paraíso, um simples cristão poderá elevar-se em trono mais sublimado acima de papas e bispos que lhe ficaram aquém em santidade. Aos apóstolos, em vista da sua missão extraordinária e das suas relações tão íntimas com o Verbo humanado liberalizou Deus mais copiosamente os tesouros de seus dons sobrenaturais. Singularizados na graça e na perfeição moral sê-lo-ão também no galardão da bem aventurança. Tal significado do texto. Mas a que vem tudo isto quando se trata da supremacia de Pedro na Igreja? Versa o nosso debate sobre uma jurisdição na sociedade visível e militante de Cristo e o Sr. CARLOS PEREIRA vem-nos com o que há de acontecer no dia do juízo, depois da ressurreição dos mortos. Trata-se do governo contínuo e normal da Igreja na sua existência terrena e ele nos transporta ao que será uma dia nos céus! Fala do tempo e ele nos leva aos umbrais da eternidade! Evidentemente, a pontaria errou o alvo. O texto não faz ao caso.

Missão à Samaria. - Nem mais concludente é o que se lê nos Atos: "Quando os apóstolos que estavam em Jerusalém ouviram que a Samaria havia recebido a palavra de Deus enviaram (Carlos Pereira traduz: mandaram) para lá Pedro e João". 65 "Com indubitável certeza, conclui categórico o nosso exegeta, os subalternos não mandam a seu superior", p. 238. - Não mandam,, isto é, não ordenam (jubere), de acordo; não mandam, isto é, não enviam (mittere, ἀποστέλλειν), falso. O gramático tresleu o texto de S. Lucas.
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62. Matth., XIX, 28

63. Act., VIII, 14

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Entre ordenar e enviar vai grande diferença. Ordenar é mandar, determinar como senhor ou superior. Enviar diz apenas obter eficazmente que outro vá. Envia-se mandando, envia-se aconselhando, envia-se suplicando. Do simples emprego desse termo impossível inferir relações de igualdade ou superioridade entre quem envia e quem é enviado.


Os israelitas Phinees e os príncipes das tribos a Galaad. 64 Os fiéis de Antioquia enviam Paulo e Barnabé aos apóstolos de Jerusalém. 65 É linguagem corrente dizermos: os irmãos enviaram ao pai o irmão mais velho; o capítulo enviou o bispo a Roma; o exército enviou o general ao soberano. Ora, que nos dizem os Atos? Que expressão empregam? Talvez ordenar, jubere? Não, mas enviar, mitere, ἀποστέλλειν. Não há, pois, como concluir daí a superioridade de Pedro sobre os apóstolos ou dos apóstolos sobre Pedro. A questão da primazia não a decide nem a pode decidir o texto. Nele certamente não se trata de missão potestativa, porque S. Pedro, ao menos não era inferior aos demais apóstolos, mas sim de missão deliberada em conselho e sufragada muito provalvelmente pelo próprio Pedro.

Os samaritanos eram odiados pelo Judeus, S. Filipe pregara-lhe o Evangelho e muitos deles foram batizados. Cumpria agora impor-lhes as mãos para que recebessem o Espírito Santo, e ao mesmo tempo unir com os vínculos da mais fraterna caridade a nova cristandade à igreja mãe de Jerusalém. Empresa delicada que facilmente poderiam malograr os preconceitos inveterados e as antipatias tradicionais entre os dois povos. A quem confiá-la, com maior esperança de êxito, senão ao príncipe dos apóstolos, por todos tido e respeitado como chefe da Igreja nascente? A eleição de Pedro em tão dificultosa emergência longe de aproveitar à tese protestante é mais uma confirmação da estima e da reverência que lhe consagravam os outros apóstolos. A CARLOS PEREIRA não ocorreram estas considerações. Transformou primeiro o enviar em mandar e, a breve trecho, em dar ordens, e com o benefício desta escamoteação exegética, concluiu vitorioso pelo absurdo de "Pedro, chefe ao mesmo tempo que recebe ordens de seus inferiores", p. 239.

S. Paulo, campeão "antipapal". - Depois de S. Lucas é São Paulo chamado ao combate contra o primado de Pedro. Na sua segunda epístola aos Coríntio escreve o apóstolo das gentes:___64. Josué, XXII, 15,14

65. Act., XV, 2.
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"Cuido que em nada tenho sido inferior aos grandes apóstolos". 66




Açodado, conclui logo o exegeta protestante: "entra pelos olhos que esta asserção absoluta de Paulo é incompatível com a teoria romana". p. 240. - No entanto, nada mais óbvio e mais simples que a interpretação natural da passagem citada. Depois da primeira viagem de Paulo a Corinto, alguns pseudo-apóstolos haviam trabalhado por minar a obra evangelizadora do grande convertido. Menoscabar-lhe a autoridade pareceu-lhes o melhor alvitre para lograr o bom êxito dos seus intentos. Paulo não havia conhecido a Cristo durante a sua vida mortal, era um convertido da última hora. Com que direitos se arrogava a dignidade de apóstolo e usurpava os direitos e privilégios exclusivos do Doze? Contra essas insinuações malignas que ameaçavam comprometer o fruto da sua pregação aos coríntios, insurge indignada a consciência de Paulo e reivindica desassombradamente os títulos autênticos de sua missão. Como os Doze, também ele fora diretamente escolhido por Cristo, também ele recebera a sagração divina do seu apostolado. Apóstolo era-o também no sentido pleno e genuíno da palavra, apóstolo, era-o tão legitimamente como os eleitos da Galiléia e não inferior a nenhum deles na dignidade apostólica. Sua igualdade aos Doze na missão evangelizadora do mundo - eis o que Paulo pretende inculcar e demonstrar aos coríntios nesta primeira epístola. Haverá, porém, no colégio apostólico uma autoridade superior, um primaz investido por Cristo na suprema jurisdição de sua Igreja? S. Paulo não o afirma nem o nega. Era aqui uma questão descabida, era assunto de todo alheio ao seu intento. Paulo passa por cima e vai direito ao âmago da controvérsia que fervia em Corinto.
Tal interpretação desse texto abraçada por muitos exegetas, principalmente antigos. Outros preferem uma hermenêutica diversa, talvez mais plausível. S. Paulo não se compara aqui com os verdadeiros apóstolos, mas com os semeadores de cizânia que em Corinto espargiam a confusão e a discórdia. Em outro lugar estigmatiza-os, sem ambages, com o seu verdadeiro nome de pseudo-apóstolos; aqui chama-os ironicamente superapóstolos (supramodum apostoli). E por uma litotes magnífica lembra aos coríntio que ele, Paulo, não fizera menos pela salvação deles que estes inflados hiperapóstolos que se jactavam de pregar um evangelho mais puro,
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66. 2 Cor., XI, 5; XII, 11.___

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mais perfeito, mais requintado. Esta interpretação a que se aliam quase todos os intérpretes modernos 67 quadra melhor com o contexto. Nos verículos 4 e 6 que imediatamente emolduram, o nosso Paulo, acupa-se exclusivamente dos seus adversários e na enumeração dos seus títulos, matéria dos caps. X, XI e XII compara-se não com os verdadeiros apóstolos mas com os falsos evangelizadores que lhe contrastavam a missão.

Em qualquer hipótese, e mais ainda na segunda, não haverá crítico sensato que nesta perícope possa enxergar visos sequer de uma dificuldade real contra a primazia de Pedro. CARLOS PEREIRA, porém, com aquele desequilíbrio que tantas vezes se lhe nota entre a inanidade das premissas e a turgidez enfática da conclusão, sentencia que a asserção de Paulo "vibra golpe mortífero na herança papal do primado de S. Pedro", p. 240.

Oportunidade de novas tiradas declamatórias contra o papado, oferece-lha um tópico da epístola aos gálatas. Ei-lo: "Quatorze anos depois subi outra vez a Jerusalém com Barnabé, levando também a Tito. Mas subi em consequência de uma revelação; e expliquei aos fiéis o Evangelho que prego entre os gentios, e particularmente àqueles que pareciam ser de maior consideração, por temor de não correr ou de haver corrido em vão: Quando, porém, àqueles que pareciam ser os mais consideráveis (quais tenham sido noutro tempo, pouco me importa, Deus não faz acepção de pessoas) aqueles, digo, que pareciam ser alguma coisa, esses nada me comunicaram. Antes, pelo contrário, tendo visto que me havia sido encomendado o Evangelho de incircuncisão como também a Pedro o da circuncisão (porque o que obrou [Deus] em Pedro para o apostolado da circuncisão, também obrou em mim para com os gentios); e tendo conhecido a graça que me foi dada, Tiago e Cefas e João que pareciam ser as colunas [da Igreja] nos deram a mão a mim e a Barnabé em sinal de companhia, para que nós pregássemos aos gentios, e eles aos circuncidados". 68 "Ora, tendo vindo depois Cefas a Antioquia resisti-lhe publicamente porque era repreensível" 69

O emprego do verbo "pareciam", a coordenação do apostolado de Pedro e de Paulo, a repreensão deste àquele em Antioquia são,no sentir de CARLOS PEREIRA, três dardos mortíferos vibrados contra a primazia de Pedro 


67. Entre os católics: Knabembauer, Bisping., Ad. Maler, Relshl, Schaefer; entre os protestante: H. A. W. Meyer, Kling-Braune, G. Schedermann, Siegr. Goebel.

68. Gal., II, 1-9.

69. Gal., II, 11.


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Para a reta inteligência da linguagem de Paulo aos gálatas importa, antes de tudo, reconstruir as circunstâncias históricas dos fatos que motivaram a epístola paulina.

Como em Corinto, também na Galácia já evangelizada pelo apóstolo surdiram em sua ausência adversários e denigridores que lhe amesquinharam a missão evangelizadora.

Muitos dos judeus recém-convertidos não podiam afazer-se à ideia de que o mosaísmo, com o seu prestígio secular, com as suas promessas e milagres, com as suas gloriosas esperanças, fosse definitivamente tramontado. Obstinavam-se em salvar-lhe ao menos a substância: a teocracia, a lei mosaica, o sacerdócio aaronítico. Daí uma oposição pertinaz e irredutível à ação de Paulo, o grande apóstolo do universalismo da nova Aliança. Na Galácia, a tática dos judaizantes era insidiosa. Sem se oporem abertamente às decisões do concílio de Jerusalém, que havia declarado caducos certos ritos e prescrições da lei mosaica, espalhava à sorrelfa ser esta apenas uma concessão temporária às inovações de Paulo. O verdadeiro Evangelho era o que pregavam "as colunas da Igreja", Pedro, João e Tiago que, desde o princípio, tinham sido as testemunhas presenciais da vida do Mestre e os depositários autênticos dos seus ensinamentos. A fé em Cristo bastava sim para a salvação, mas as observações mosaicas davam ao crente uma perfeição, um acabamento que nunca poderiam atingir os incircuncisos que não as praticavam. Paulo era um inovador perigoso. Ontem ainda perseguidor fanático de Cristo, hoje crente e pregador improvisado, na nova carreira por ele iniciada reviam toda a presunção e o orgulho do antigo inimigo do nome cristão. O evangelh0 que pregava era um Evangelho mutilado e incompleto; afeiçoara-o ele ao jeito de idéias revolucionárias. Importava, pois, voltar aos ensinamentos das colunas da Igreja, moldar-se sobre a sua vida recebendo a circuncisão e submetendo-se a todas as prescrições da Lei antiga. Só assim era lícito aspirar às honras de verdadeiro filho de Abraão e herdeiro de suas promessas.

Estas capciosas sugestões haviam, ao menos parcialmente, surtido efeito. As novas cristandades da Galácia recém-vindas do paganismo debatiam-se na incerteza e na perplexidade. Um perigo de cisma iminente ameaçava arruinar as conquistas do grande apóstolo. Conjurar esse perigo justificando a sua doutrina, eis o alvo de Paulo na sua epístola.

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Postas essas premissas nada mais fácil que demonstrar a máquina de guerra levantada pela exegese protestante. Examinemo-la, peça por peça.

Quanto ao verbo "pareciam", não há mais que um sofisma embarcado no equívoco de uma palavra. CARLOS PEREIRA toma o verbo "parece" no sentido, comum na nossa língua, de ostentar a aparência de uma coisa sem lhe possuir a realidade. Daí a fácil e maravilhosa conclusão: para Paulo, os apóstolos Pedro, Tiago e João eram exteriormente julgados como colunas da Igreja, de fato, porém, não o eram! Para o bem fundado dessa inesperada consequência só lhe faltou demonstrar que esse era realmente o significado do termo no texto original. Essa demonstração ele julgou mais prudente deixá-la na sombra do silêncio. Mas qualquer exegeta de fracas posses sabe que o verbo δοκειν, videri, parecer, tem, não raro, o sentido de ser alguém estimado, havido, pelo que na realidade é. 70 A força, pois, da expressão e do argumento paulino é a seguinte: "Dizeis que meu evangelho não é genuíno nem autêntica minha doutrina. Pois ficai sabendo que em Jerusalém a declarei sem dissimulações aos que só para vós são os depositários do verdadeiro cristianismo, conferi com os apóstolos que indiscutivelmente são por todos considerados como as colunas da Igreja. Condenaram-na? Repreenderam-na? Não. As autoridade da igreja Jerosolimitana (v. 6) não me fizeram observação nenhuma, nada de novo me comunicaram, mas, com seu consenso, aprovaram sem restrições os meus ensinamentos. Mais. Pedro, João e Tiago, aos quais como verdadeiros apóstolos competia examinar a minha doutrina, reconheceram a legitimidade do apostolado que Deus me confiara, e, em sinal de amizade fraterna, me apertaram a mão" - Dai agora ao verbo "parecer" o sentido imaginado pelo Sr. CARLOS PEREIRA e o argumento paulino desossado, enervado não passa de uma puerilidade insulsa.
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70. Cfr. por ex.: Marc., X, 42; Luc., XXI, 24.


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Vamos à coordenação do apostolado de Pedro e de Paulo.

Trata-se aqui, porventura, do primado de jurisdição? Nem por sombra. Trata-se, ao menos, de uma repartição exclusiva do campo do apostolado: Nem isso. Paulo bem sabia que Pedro fora quem primeiro batizara os gentios e os recebera na Igreja. Alguns anos antes, ele próprio ouvira dos lábios do Príncipe dos apóstolos essa declaração formal: "sabeis que desde os primeiros dias ordenou Deus entre nós que por minha boca ouvissem os gentios a palavra do evangelho". 71 De outro lado, Paulo nunca limitouy a sua pregação aos gentios. Nas suas escursões apostólicas seu primeiro cuidado era anunciar a boa nova aos judeus. Só depois de replelido pelos obstinados filhos de Israel, dirigia-se aos incircuncisos mais dóceis e menos obecados. 72 O passo da epístola aos gálatas não pode, pois, ser interpretado senão no sentido de uma divisão temporária e nãoe xclusiva. Considerando historicamente os 12 ou 14 anos decorridos, relevava Paulo como Deus abençoara com numerosos milagres e conversões os seus trabalhaos entre os genrios como abençoara os de Pedro entre os judeus. E por que razão, sob este aspecto (note-se bem: não se trasta aqui de jurisdição), compara S. Paulo o apostolado com o de Pedro? Não haviam também os outros apóstolos pregado aos judeus: Por que falar de Pedro aos gálatas que havia poucos anos ele, Paulo, e só ele convertera e doutrinara? Não há outra explicação plausível senão a primazia do mesmo Pedro. Só o posto singular por ele ocupado na Igreja, só o reconhecimento universal de sua suprema autoridade em todas as igrejas justificam neste passo a menção expressa do nome de Pedro e a omissão dos outros apóstolos.


Ao episódio de Antioquia. - Achavam-se Pedro e Paulo nesta cidade, cujos cristão eram em grande parte convertidos do gentilismo. Adaptando-se às exigências do meio, viviam os dois apóstolos com os étnico-cristãos sem se adstringirem à observância dos preceitos da lei mosaica, já ab-rogada. Senão quando sobrevieram de Jerusalém alguns judeus-cristãos, zelosos dos ritos antigos. Temendo escandalizá-los com o seu exemplo, Pedro, pouco a pouco, começou a subtrair-se das refeições gentílicas e adaptar-se às prescições da Lei, como, por prudência, costumavam fazer todos os apóstolos quando praticavam entre os convertidos do judaísmo.


71. Act. XV, 7

72. Cfr. Act., XII, 14; XIV, 1; XVII,10; XVIII, 4; XIX, 8; XX, 21; XXI, 21; XXVI,29; XXVIII, 17; I Cor., X, 19,21



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 Tiago, em Jerusalém, foi, até ao fim, fiel observante das tradições judaicas. Paulo por igual motivo cicuncidou a Timóteo e, em uma das suas viagens a Jerusalém, foi ao templo, purificou-se e ofereceu as oblações legais por quatro nazireus pobres. O retraimento de Pedro, portanto, significava apenas um ato de caridade, um condescendência com a fraqueza dos neoconvertidos. Em Antioquia, porém, as circunstâncias não eram idênticas às da metrópole judaica. Paulo, que apostolara quase sempre entre os gentios, previu toda a vantagem que do procedimento autorizado dos apóstolos poderiam tirar os seus adversários. Efetivamente, muitos judeus e o próprio Barnabé já haviam cedido à influência poderosa do exemplo de Pedro; eles também já não comiam com os gentios. Em tão grave contingência, como única via para atalhar o perigo afigurou-se ao apóstolo das gentes mostrar publicamente que a atitude de Pedro, justifiável em Jerusalém, não era de todo o ponto conforme com a verdade plena e definitiva do Evangelho que havia para sempre libertado os cristãos das peias quase incomportáveis da lei mosaica. Um dia, provavelmente num dos ágapes dos irmãos, em presença de S. Pedro, advertiu-o publicamente: "Se tu, sendo judeu, vives como os gentios e não como judeu, por que obrigas [com o teu exemplo] os outros a judaizarem?" 74 - Há nesta admoestação pública uma negação implícita do primado? De modo nenhum. S. Paulo não desobedece a nenhuma ordem de S. Pedro, não se opõe à sua doutrina, não contesta a legitimidade da sua primazia, não tem uma só palavra que ponha em dúvida os seus direitos e títulos para exercer sobre fiéis e pastores da comunidade cristã tão poderoso e eficaz ascendente. Na dificuldade da emergência, em que se achava, procura apenas reconduzir Pedro à sua primeira atitude em relação aos convertidos do gentilismo. Era o único meio de defender o seu apostolado contra as acusações insidiosas dos judaizantes. A sua não é, pois, uma repreensão autoritativa de superior a inferior; não na podem admitir os próprios protestantes que defendem a paridade jurisdicional dos apóstolos. É, sim, uma correção fraterna que em circunstâncias graves pode e, até, deve fazer um igual ao seu igual, um inferior ao seu superior.
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73. O hebraismo restiti in faciem (v.11 quer dizer resistir publicamente, coram omnibus, como diz pouco abaixo o própio Paulo (v. 14)

74. Gal., II, 14.
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Ditou-a a caridade em cuja linha somos todos iguais, não a autoridade que distingue hierarquicamente os membros de um corpo social.

Fácil é agora de compreender por que S. Paulo na sua epístola aos gálatas refere com todos os pormenores o episódio de Antioquia, omitido por S. Lucas. Pedro, advertido pelo apóstolo das gentes, não só não lhe replicara, mas, anuindo, aprovara manifestamente a sua doutrina. Que melhor argumento contra os que na Galácia o acusavam de novidade do que a sanção suprema do príncipe dos apóstolo!
Tal é a única e verdadeira significação deste célebre passo da epístola paulina que os protestantes procuram agora explorar contra o primado de S. Pedro. Conheceu-o toda a antiguidade cristã e nunca lhe exergou o menor vislumbre de protesto antecipado "às usurpações papais" que agora lhe empresta a crítica do Sr. CARLOS PEREIRA. É até notável como por ocasião deste incidente timbram os antigos intérpretes em revelar a virtude e a autoridades de Pedro. "Pedro, diz AGOSTINHO, aceitou com santa e piedosa humildade a observação que utilmente lhe fizera Paulo inspirado pela liberdade do amor, deixando destarte aos pósteros o raro exemplo de se não dedignarem em ser corrigidos pelos inferiores onde quer que se desviassem do reto caminho: exemplo mais raro e mais santo que o deixado por Paulo aos inferiores que, por defender a verdade evangélica, ousarem resistir confiadamente sem lesar a fraterna caridade... Em Paulo louvemos a justa liberdade, em Pedro a santa humildade".75

Com efeito, a quem as considera mais de espaço, as circunstâncias do fato revelam manifestamente a superioridade de Pedro. Paulo pregara expressamente que se não devia judaizar. Pedro, com seu exemplo parecia ensinar o contrário. E a sugestão deste exemplo era tão forte que obrigava (coegebat) não só os outros judeus, mas o próprio Barnabé, companheiro de Paulo, 76 a judaizarem.___

75. Epist., 82, n. 22 (ML, XXXII, 285-6). Cfr., também TEODORO DE MOPSUESTA, In epist. ad Galat., n. 20, 21; GREGÓRIO MAGNO, iN eZECH., 1. 2, HOM. 6, N. 9 (ML, LXVII, 773).

76. "Dès que S. Pierre eut cédé, Barnabé plia... A Antioche en des circunstances identiques à celles qu'il avait une première fois afrontées, cet homme si persévérant qu'il semblerait quelquefois infexible fait subtemen volte-face. Est-ce à dire que ren n'est chagé que barnabé lui même?..., une seule chose, c'est que Pierre s'est personellement remis à l'observance de la loi. Barnabé se trouva alors placé entre tout ce qu'il y a d'auytorité dans l'Église d'une part [decreto de Jerusalém, Judas e Silas que o promulgaram em Antioquia, Pedro que o propôs, Tiago que o aprovou. Paulo] et l'autre non pas l'autoirté mais la contuite de Pierre; et comme les Antiochiens il suit Pierre". X ROIRON sait Paulo, témoin de la primauté de SDait Pierre, na Recherches de Science religieuse, 1913, pp. 511-513.


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Como explicar a prevalência de exemplo tácito de Pedro sobre a pregação explícita de Paulo sem admitir a persuasão universal de que Pedro sobrelevava em dignidade a Paulo e a sua era a autoridade suprema na Igreja?

Assim que todos os argumentos coligidos pelo pastor protestante contra o primado de Pedro vêm, em última análise, confirmar a tese católica. Só falseando indignamente a significação das palavras e dos fatos da Escritura pôde o Sr. CARLOS PEREIRA apresentar aos seus leitores no procedimento de Paulo a atitude de um "campeão antipapal", p. 242. Para colorir aos olhos dos leitores a legitimidade de tão descabelada conclusão era mister não só recorrer aos artifícios de uma exegese tendenciosa mas ainda passar em injustificável silêncio todos os trechos em que o grande apóstolo das gentes insinua inequivocamente o alto conceito em que tinha a dignidade e a primazia de Pedro. Chama-o quase sempre com o nome hebraico Cefas que lhe impusera Cristo como que a relembrar a alta função, que lhe fora confiada, de pedra fundamental da Igreja. Todas as vezes 77 que menciona os apóstolos, a Pedro cede sempre o lugar de honra. "Cada um de vós diz: eu na verdade sou de Paulo e eu de Apolo e eu de Cefas e eu de Cristo".78 O clímax é evidente: Paulo, por modéstia, ocupa o último lugar, Cristo o primeiro, imediatamente antes de Cristo, Pedro. Talves, os apóstolos são reunidos sob uma expressão coletiva, só Pedro é explicitamente nomeado numa saliência singuarmente enfática: "Acaso não
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77. Só uma excessão aparente à regra geral se lê no passo já citado da epístola aos Gal., II,99: "Tiago e Cefas e João que pareciam as calunas da Igreja" etc. Poderíamos responder que não é certa esta lição. Os códices gregos D, E, F, G lêem: Pedro, Tiago e João. A esta ordem se atêm muitos Padre antigos, entr os quais, Tertuliano, Crisóstomo, Amnbrósio, Agostinho, Jerônimo e Tepodoreto. Mas não é mister recorrer a esta solução. A preferência dada aqui a Tiago explica-se anturalmente pelo alto preço em que o tinham os judiazantes que do nome do bispo de Jerusalém tanto abusavam contra a autoridade de Paulo. Para confutá-los frisa aqui S. Paulo como por Tiago, também por Tiago, primeiramente por Tiago fora reconhjecido como apóstyolo legítimo.

78. O Cor., I, 12. Semelhante gradação lê-se no cap. III, 22. No cap.IX, 4-6 "Os outros apóstolos e com os irmãos do Senor e Cefas". Cefas distinto dos demais, ainda dos que se chamavam irmãos do Senhor. No ´c. XV, 3-5 "Desde o princípio vos ensinei o que havia aprendido: que Cristo morreu... e ressurgiu e foi visto por Cefas e dpois pelos onze".
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Temos nós o direito de levar uma mulher irmã assim como os outros apóstolos e os irmãos do Senhor e Cefas?"79

Alhures na epístola aos gálatas diz que três anos depois de sua conversão subiu a Jerusalém para ver a Pedro e com ele passar quinze dias. 80 Por que em Paulo esta solcitude de ver a Pedro e não aos outros apóstolos? Responde CRISÓSTOMO: "Depois de tantas e tão preclaras façanhas... foi visitar a Pedro como a superior e mais antigo". E notai a energia intraduzível do original grego sublinhado pelo mesmo CRISÓSTOMO: "Não disse ἰδεῖν senão ἱστορῆσαι que se costuma empregar no sentido de quem vai visitar as grandes e explêndidas metrópoles, dignas de ser admiradas e conhecidas". 81


Sinceramente, tudo isto se concilia bem pouco com a quixotesca postura de "campeão antipapal" em que caricaturou irreverentemente o Sr. CARLOS PEREIRA.

S. Pedro e os papas. - Como chave de ouro desta série de argumentos do "zeloso" pastor aparece o testemunho do própio S. Pedro. A sua atitude humilde, diz o Sr. CARLOS PEREIRA, bem mostra que "ele ignorava inteiramente possuir a posição e os títulos pomposos que em seu nome os papas sacrilegamente assumem", p. 242. Nas suas epístolas, continua o crítico, nada há que "se compara com um decreto do Vaticano". Em palpável contraste com os anátemas e o autoritarismo vanglorioso das bulas papais, escreve S. Pedro: "Simão Pedro, servo e apóstolo de J. C."; "esta é a rogativa que eu faço aos presbíteros, eu presbítero como eles", p.243.


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Exemplo de bula papal



"Servus Servorum Dei" (Servo dos Servos de Deus)









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Nugas e futilidades, tudo isto. S. Pedro não proclama o seu primado? Quid inde? Mas "corria-lhe o sagrado dever...
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79. A propósito da primeira epístola aos coríntios citemos aqui a conclusão de ROIRON" "Em resumo, pelo 1.ª aos coríntios sabemos que aos olhos da Igreja de Corinto, Pedro ainda que até então não tivesse nenhuma relação com ela, era o primeiro dos apóstolos, o maior depois de Cristo. É ponto este de que se não pode duvidar. Nem é menos certo que Paulo, por meio do qual conhecemos o estado de espírito dos coríntios a este respeito não tenta de modo algum modificar essa idéia que formavam da posição superior de Pedro na Igreja. Paulo contrário, sua linguagem à vazada em modo de confirmar os fiéis nesta sua maneira de ver. Enfim é, eplo menos, muito provável que a persusão dos conríntios não tenha outra origem senão o próprio Paulo". XAVIER ROIRON, Saint-Paul, témoin de la primauté de Pierre, nas Recherchesde Science religieuse, 1913, pp. 498-499.

80. Gal., I, 18.

81. "Post tanta ac tam praeclare gesta... ascendit velut ad moaiorem et seniorem". - "Non dixit idein sed ittoresai quomodo loqui solent quem magnas ac spendidas urbes adeiunt spectandi cognoscendique causa". Comment, in epist. ad Al., I, 11 (MG, lxi, 631). TEODORETO: "Appotolorum principi convenitem tribuint honorem! (MG, LXXXII, 467).
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de apresentar estes títulos à obediência dos povos", p. 243. - Não; Lutero não havia nascido. Nâo era a protestantes que escrevia S. Pedro, mas a cristãos que haviam recebido o Evangelho, que lhe conheciam a autoridade conferida por Cristo, que, nem por sonho, pensavam em pô-la em dúvida. Mas, que contrate entre as epístolas de S. Pedro e as bulas papais! - Manifestamente o Sr. CARLOS PEREIRA nunca leu uma bula papal. Como S. Pedro, dirige-se o papa aos bispos saudando-os com o doce nome de irmãos. O papa assina-se: servo dos servos de Deus. ão são essas expressões de "autoritarismo vanglorioso". - Mas os papas intimam ordens, ameaçam castigos, fulminam anátemas! - Como toda a autoridade cônscia do seu dever como o humilde S. Pedro. Vede-o diante do Sinedrim que pretendi agrilhoar a liberdade da Igreja nascente, como opõe com hombridade às usurpações do poder civil o divino "non possimus", "é necessário obedecer antes a Deus que aos homens". 82 Vede-o com que severidade julga e reporeende publicamente o pecado de Ananias e Safira: e como o Espírito Santo, ratificando-lhe a sentença, fulmina de morte os culpados. 83 Vede-o cpm que desassombro repele as propostas sacrílegas de Simão Mago e lhe encarece a gravidade do pecado. 84 Os papas não fizeram outra coisa. Fustigaram os vícios, condenaram os criminosos, defenderam com invicta constância a liberdade eclesiástica contra exorbitâncias da força e os caprichos dos poderes humanos. Como S. Pedro, com a humildade evangélica souberam conciliar a grandeza d1alma, a independência da Igreja, a resistência inquebrantável na defesa dos interesses de Deus na terra. As grandes e heroicas lutas do papado na história são apenas fases diversas da eterna guerra entre a verdade e o erro, entre a virtude e o vício, entre o direito e a força, entre o bem e o mal. Daí os ódios.






Superioridade de S. Pedro nos Evangelho. - Percorremos toda a bateria de argumentos assentada pelo crítico protestante contra a supremacia de S. Pedro sobre os outros apóstolos. Não nos foi árdua a empresa de desmantelar todo esse engenho de guerra. A tese católica acha-se tão fortemente blindada que não serão os dardos despontados de uma crítica apaixonada que lhe hão de varar a
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82. Act., IOV, 20; V, 23.

83. Act., V, 5 seq.

84. Act., VIII, 20.
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armadura divina. A Escritura e a consciência da Igreja são broquéis que os sofismas humanos não amolgam.
Já conhecemos os textos que estabelecem irrefutalvelmente a primazia universal de Pedro sobre toda a sociedade cristã e, portanto, também sobre os apóstolos.
Pedro é a pedra fundamental sobre a qual Cristo edificou a sua Igreja. Pertencem so apóstolos à Igreja de Cristo? Logo sobre Pedro hão de firmar como sobvre alicerce insbstituível.

A Pedro o poder universal de ligar e desligar na terra com promessa infalível de que suas sentenças serão ratificadas no céu. Logo o exercício de sua jurisdição obrigará em consciência os apóstolos como os outros fiéis.
Pedro é constituído pasto de todos os cordeiros e ovelhas de Cristo, sem nenhuma exceção. São do rebanho de Cristo os apóstolos? Logo também eles por Pedro hão de ser pastoreados.





Haverá investidura mais evidente de uma jurisdição universal? Alardeiam os protestantes a fidelidade à Escritura. Pois bem, que nos citem um só testemunho esciturístico que demonstre haver Cristo concedido uma autoridade aos apóstolos separados de Pedro ou independetemente de Pedro. Onde os outros "onze" são chamados pedras da Igreja? Onde olhes foi confiado o múnus de pastor univesal? Onde lhes foram dadas as chaves do reino dos céus?Apresentem-nos uma explicação plausível deste fato inegável: Por que a Pedro e só a Pedro foram ditas estas palavras de um alcance transcendental? Se se tratava de instituir um pode comum, uma igualdade jurídica, por que não se contentou Cristo com as palavras ditas a todos os apóstolos?
Por que dirigir-se tantas vezes singularmente a Pedro, exclusivamente a Pedro: Beatus es Simon Barjona; Tibo dabo claves; Simon, simon, ego rogavi pro te, ... confirma frates tuos; Simon, diligis me plus his: Pasce anos meos?
À luz destas declarações tão explícitas perguntamos sinceramente: quem vionta a Escritura? Que exegese é mais racional, mais fiel ao texto a católica ou a protestante?

Exercício do primado na Igreja pimitiva. - Mas, insiste o adversário, Pedro não exerceu jurisdição nenhum sobre os seus colegas no apostolado. Os Atos de S. Lucas não atestam o exercício do primado.

Fosse muito embora verdade, que interir daí? Porventura cessa de existir uma lei porque alguém não usa os direito que ela confere?

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As palavras de Cristo constituem uma lei divina; se Pedro não tivesse exercido os direitos que ela lhe outorgava, é que talvez não visse a necessidade deste exerício. Sobre os seus co-apóstolos investidos extraordinariamente do dom da infalibilidade não era mister por em ação todas as prerrogativas do seu poder jurisdicional. Repetimos: o não uso de um direito divinamento outorgadonão provará nunca a sua inexistência.
Mas é realmente exato que os apóstolos não deram provas de reconhecer essa primazia ou que a história da Igreja primitiva não contenha vestígios do seu exercício? Assim o pensa o nosso esforçado exegeta. "Diremos com distinto escritor:85 - a ausência de sol ao meio-dia não é mais notável do que a ausência da supremacia oficial de S. Pedro nas páginas do Novo Testamento" p. 243.
Aos fatos. Os apóstolos não deram mostras de reconhecer a primazia de Pedro? Mas por que todos os evangelistas, sem exceção de uma só, todas as vezes, sem exceção de uma só, que falam do Doze ou tecem o catálogo dos seus nomes dão sempre a Pedro o primeiro lugar de honra e de primazia? Não é esta prioridade altamente sighnificativa, mormento depois das antigas contendas sobre qual deles era maior? Disputaram então sobre quem era o primeiro. O primeiro, ei-lo agora: "Primeiro, Simão que se chama Pedro".56
A história da Igreja primitiva não conserva vestígios de exercício do primado? Abramos o livro dos Atos. Como é sabido, a obra de S. Lucas divide-se em duas partes. Na primeira, que se estende até o c. XII, o autor bosqueja em rápido escôrço a história dos primórdios da Igreja, a sua fundação, desenvolvimento e progresso.na segunda posta de lado a relação dos trabalhos dos outros apóstolos,cinge a narrativa às excursões de S. Paulo, de quem fora quase sempre companheiro de lugas. É, pois, na primeira parte dos Atos que devemos procurar os vestígios primitivos da atuação do primado. Ora, quem percorre desprevenidamente estas páginas não poderá furtar-se à impressão do papel realmente singular desempenmhado por Pedro. Não pretendemos que, tomado isoladamente, cada um dos fatos aí referidos seja suficiente para estab elecer a suprima jurisdição do príncipe dos apóstolos. Mas o seu complexo impõe-se;
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85. Não conhecemos o nome do "distinto escritor". O Sr. Carlos Pereira não quis dar aos seus leitores o prazar de avaliar os altos quilates da sua distinção.

86. Matth., X, 2.

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e não há explicá-lo racionalmente senão admitindo a interpretação católica dos oráculos bíblicos que já deixamos expostos.
Folheai o Atos. Quem anuncia por primeiro o Evanmgelho aos judeus? Pedro (I, 14). Quem batiza os primeiros genrios? Pedro (II, 41; X, 9 sg.).87 Quem opera o primeiro milagres em confirmação da fé? Pedro (III, 1 sg.). A quem se traziam os enfermos em multidões, como outroa a Cristo, para que os curasse? A Pedro (V, 15). Quem por priemrio propõe a eleição de uma ap´sotolos em lugar de Judas: Pedro (I, 15 sg.).88 Quem, sempre à frente do colégio apostólico, advoga a fama dos seus companheiro e defende a glória do nome de Jesus perante o Sinedrim? Ainda uma vez Pedro (II, 14; IV 8). Quem inflige terríveis castigos aos primeiros violadfores dos bnens eclesiásticos? Quem condena o primeiro heregbe simoníaco? Pedro, sempre Pedro (V, 4, VIII, 20). Herodes, para agradar aos judeus prednde o príncipe dos apóstolos? Toda a Igreja ora por ele (XII, 5). Reune--se o primeiro concílio em Jerusalém para decidir a controvérsia dos ritos judaicos? Pedro é quem toma por primeiro a palavrfa. Pedro quem dirime a questão (XV, 7 sgs).89
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87. Notai: a Pedro revela o Espírito Santo de modo particular a vocação dos gentios (XI, 4); a Pedro nomeadamente é enviado o centurião Corneélio, palo anjo, a fim de receber dos seus lábios a doutrina da salvação.

88. Diz o sr. Carlos Pereira: "Pedro não assume nenhuma jurisdição papal. Apenas lembra ele a conveniência da escolha. Os irmãos propõem dois e a sorte decide". p. 243. - O protestante truca de falso o texto sagrado. Pedro não lembra apenas a conveniência, impõe o dever "δεῖ" (v.21)oportet. São verbos estes que traduzem necessidade moral, obrigação. Mas por que Pedro não escolheu diretamente o substituto de Judas? S. CRISÓSTOMO: "At non licebat ispsi Pedro eligere? Licebat et quidem maxime; verum id non fecit ne cui vederetur greatificare" - Hom. 3 in Act. n. 3 (MG, lx, 35-6). Não é só com Lucas (*) que se manifesta a autoridade; melhor a exerce quem invoca a colaboração espontânea e inteligete dos súditos. O procedimento de Pedro não traduz falta de jurisdição, é suavidade prudente de governo.
(*) Nota do digitador: "ininteligível "ucasses"

89. Não, contesto o nosso gramático, Pedro "não a [assembléia] preside, não fala primeiro, nem por último resolvenod a questão. A presidência parece aculpá-la Tiago que fala por último propondo a solução aceita. Após lago debate é que Pedro se levanta para falar", p. 261. - Como se adultera a Escritura! Pedro não fala primeiro? E por que não nos diz quem foi o primeiro orador? - Pedro não toma a palavras senão "após largo debatye". - Mas é natural , nem podia deixar de ser assim. Os enviados da igre de Antioquia expuseram os seus pareceres. Algjns que haviam pertencido à seita dos fariseus opuseram-se-lhes propugnando a necessida da circuncisão (v. 4). Eis a controvérsia, eis a questão. Quem a julga:? Quem a decide? Levanta´se então Pedro e impões a sua sentença: "Sabeis, irmãos, que desde os primeiros dias ordenou Deus entre nós que por minha boca ouvissem os genrios a palavra de Deus" (v. 7). Em seguida define: "Cremos que somos salvos pela graça do Senhor J. C. assim como eles também o foram", XV, ''. Ouvida a definição, omnis multitudo tacuit, v. 12.
Insiste aidna o crédityo: "Mas é Tiago quem fala por último, quem resolveu a questão, quem impõe a solução aceita." Falso. Tiago não resolve coisa nenhum. Tiago não propóe nenhum solução nova. Fala depois de Pedro para aderir à sua sentença, para confirmá-la com a Escritura:
"Simão tem contado como Deus primeiro visitou aos gentios a fim de formar deles um povo para o seu nome. Com isto concordam as palavras dos profetas, etc." (v;14-15); Eis o que diz a Escritura. Mas que importam as Escrituras contra o empenho acirrado de mostrar que "S. Pedro não ocupa lnessa assembléia eclesiástica nenhuma das posições que o papa ou os seus legados reclamaram séculos depois"? p.261.
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Pedro é quem percorre as igrejas da Judéia, da Galiléia e da Samaria, visitando e consolando a todos (IX, 31-32), "como um general, comenta Criosóstomo, que passa revista às suas tropas".90Por toda a parte e sempre, na propagação da Igreja, na sua administração, na promulgação de suas leis, no exercício do poder judiciário, na defesa da fé e dos costumes, na tutela da liberdadecristã, na iniciativa e na direação dos atos comuns do colégio apostólico, Pedro giganteia entre os seus colegas como priemiro, como autoidade, como chegfe supremo. Ele exerce indiscutivelmente o primado; os apóstolos e os fiéis reconhecm-no sem hesitação nem controvérsias.91Ainda assim Carlos Pereira,m apadrinhado por "distinto escritor", notaria mais depressa a ausência do sol ao meio-dia que a supremacia de Pedro nas páginas do Novo Testamento!Que eclipse total da sinceridade e do bom senso!



Depois de haver fundado as igrejas de Jerusalém e de Antioquia, as mais célebres da Ásia, o príncipe dos apóstolos fêz-se na volta do Ocidente, partindo para a conquiesta de Roma, baluarte das superstições gentílicas e destinada nos planos da Providência a centro da unidade cristã. N cidade dos Césares estabeleceu Pedro a sua cátedra episcopal; nela, com a púrpura do seu sangue, inaugurou a dinastia imortal do supremo Pontificado.
É o que passaremos ora a demonstrar contra os sofismas da crítica protestante.
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90. "Quasi dux circumibat orines suos considerans, quae pars esset coadunata quae sua paesentia egeret" Hom. 21, in Act. n. 2 (MG. LX, 165).

91. Tão evidente é a supremacia de Pedro sobre os demais apóstolos que toda a aantiguidade cristão não hisitou um só instante em reconhecê-la expressamente. Principe dos apóstolos, chefe dos ap´sotolos, cabeça do colégio apostólico são expressões que nos deparam a cada passo a leitura dos antigo Padres. Caput apostolorum chamam-no S. GREGÓRIO NISSENO, Or. 2 de St. Steph. 4 (MG. XLVI, 733), S. EFRÉM, Comment. in epist. S. Pauli, Venetiis, 1893, p. 128. Apostolorum prenceps: ORIGENES, hom. 17 in Luc. (MG. xiii, 1845), EUSÉBIO DE CESARÉIA, In Ps. 68, 8 (MG, XXIII, 737. S. CRISÓSTOMO, Hom. de decem mill talent in 3 (MG, LI, 20), S. CIRILO ALEXANDRINO, in Joan. Evang. I, 12(HG, LXXIV, 662), S. AFRAATES, demonstratio 7
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